quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Sem parágrafos

Por momentos  - loucos, é certo - esqueço-me de mim e sou capaz de amar. Amar sem parar, com direito às anulações, sofrimentos e despersonalizações que os amores parecem ter. Por momentos - curtos e fugazes - eu esqueço-me de mim e sou, inteiramente, completamente, antagonicamente teu. Entrego-me, como quem não espera um amor livre. Dou-me como quem sente que as minhas vísceras são as tuas entranhas. Abraço-te como quem encosta os corações, que outrora estavam frios, gelados e nus. Aproveita, meu amor, eu sou teu. Aproveita que estou louco e leva-me contigo, para sempre. Rapta-me o corpo, a mente e o descanso eterno deste insano coração. Corres, contudo, o sério risco de não me levares por inteiro. Prefiro trair o coração que a mente, amar a imagem do que viver intensamente a vida de outrem. Amor, querido e visceral amor, leva-me e mostra-me que existes. Não sei quantas horas tenho para cumprir esta promessa que fiz a mim mesmo. A memória irá voltar e corres risco de já não me achares. Estarei noutra terra, com outro amor, num mundo paralelo onde não saberei esperar mais. Não desistas de me encontrar. Não me digas falsas-verdades. Não me elogies gratuitamente. Não me mintas, por favor. É tudo o que te peço, porque é tudo que o amor exige do outro. 

Luís Gonçalves Ferreira

3 comentários:

Anónimo disse...

Não me digas que este texto foi dedicado a DIP?
Eu prefiro que ele não me procure, e que definitivamente não me encontre.

"Por momentos - loucos, é certo - esqueço-me de mim e sou capaz de amar".
OMG Doutor, só consegue amar quando não está em si? Por breves instantes, ainda por cima.
Por que não amar e estar consciente disso?

kisses*

Luís Gonçalves Ferreira disse...

Eu não disse isso. Eu disse "esqueço-me de mim". Como deve saber amar, como em tudo, implica um controle imenso daquilo que somos, por forma a nos adptarmos. Quem não se adapta à existência do outro e deixa, por momento, de ser um pouco de si, não conseguirá viver o sentimento intensamente. Por mais pequeno que seja, o amor implica que se diga, pense e fale menos coisas, porque simplesmente existe um outro ser humano, ele mesmo com urgências e emergências que não são todas compatíveis e recíprocas. Ignorar a anulação substancial que o amor implica é basicamente o mesmo que ignorar a essência do amor, que mais não é que a partilha. Onde há partilha há privação. Ora tenta dividir um bolo: Quando mais pessoas há para dividir menos te sobra. É a matemática básica da vida.
Depois quem não percebe de amor sou eu.

Beijo, Querida Doutora!

Anónimo disse...

Oi Luís, não sou um grande entendedor das coisas do coração, quanto mais do amor. Me sensibilizei com o texto apesar de que possa tê-lo interpretado errôneamente. Minha escrita é crônica, "filosófica" talvez; não me sinto capaz de adentrar palavras de poesia, nem quero consolações, apenas admiro o que é belo, eis aqui a minha situação e elogio ao lido.

Forte Abraço
Marco

"Entre o pensamento e a poesia há um parentesco porque ambos usam o serviço da linguagem e progridem com ela. Contudo, entre os dois persiste ao mesmo tempo um abismo profundo, pois moram em cumes separados".

Heidegger