segunda-feira, 4 de abril de 2011

Ensinamentos

Passei vezes sem conta junto à porta onde enfermavas. Corri, vezes sem conta, na oposta direcção dos cuidados prestados por alguém à tua dor. Dói recordar esses passos. Não prezei a nossa história. Não te prezei devidamente. É o maior remorso da minha vida aquele que me ensinaste no leito da tua morte. A partir daí jamais dei menos que "tudo" às pessoas. E isso tem um contra-peso, como tudo na vida: não receber menos que "tudo" causa desilusão. É talvez o maior egoísmo de se viver aprisionado em valores: não sabermos descolar-nos do molde. A partir daí magoei-me como nunca tinha acontecido.
Em teu respeito, mesmo que volte a sofrer, fá-lo-ei até encontrar alguém tão humanamente irrepreensível como tu o foste... 

Luís Gonçalves Ferreira

Escrita em círculos

Sinceramente, não sei o porquê de escrever. Não é pela mera qualidade das palavras nem tão-só pela simples necessidade de entendimento que às comunicações humanas subjaz. Disso eu sei. Não venho aqui, porque quero só comunicar as coisas do dia-a-dia (aliás, nem o tenho feito). Não sei onde pára o suor do meu rosto que um dia glorifiquei aqui. Não sei onde está a autenticidade forçada de antes, mas conheço-me melhor agora. Sei coisas e desconheço milhões de outras acima delas. Desconheço esta força química, visceral, meta-física que me traz às linhas públicas da espingarda das letras. Confesso-vos que me acontece quando estou pior. Confesso-vos que sei disso e não queria que isso acontecesse. Poderá o leitor pensar que o queixume é vão e as palavras dos outros servem só para reconfortar. Não é isso, leitor. Não é isso. É uma comunicação de mim para mim, quero explicar-lhe. Como se fosse um sussurro no próprio ego, na própria alma, percebe? Outros amantes da escrita irão entender isto, estou certo. Irão todos perceber, mesmo aqueles que acreditam que as palavras apenas servem para comunicar coisas mais ou menos caras ao físico e ao corporal da vida. Não, não é isso, mas não sei quantificar esta energia que me destila a alma. É estranho, confesso-lhe. Não sei se o trato por você ou tu, leitor. A mim - o leitor de mim mesmo - escuso-me a tratamentos, por desconhecer o tratamento concreto merecido. Mas o leitor merece mais do que essa hipocrisia de não saber. Apeteceu-me escrever sobre  a escrita. Não há nada mais irónico do que círculos: são piadas de si mesmos. Não há novidade no regressar ao mesmo. Só há piada quando se junta ao mesmo algo diferente e tudo muda. Uma molécula... Será o círculo com graça? Existe fricção, movimento, novidade. Os homens são círculos com graça? Comecei na escrita e vou em círculos. 
Vá se lá perceber a relação das coisas do mundo. 
Vá se lá perceber as relações deste texto. 
Vá se lá perceber a mente do autor deste texto. 
Veja se percebe, leitor, tão-somente a sua mente. 
O autor está a tentar fazer o mesmo.

Depus a máscara e vi-me ao espelho.

Luís Gonçalves Ferreira

sábado, 2 de abril de 2011

Chegaste a um ponto que já não sabes quem és, aonde pertences ou do que realmente gostas. A sociedade, o produto da ocasião transformou-te. A metamorfose por que todos passaram e que tu criticaste insistentemente, apoderou-se de ti. Por mais que te custe aceitar, o passado é passado e não podes viver da mesma forma de há 5 ou 6 anos. Se a vida era mais colorida, concordo contigo. Mas, pensaste sempre no futuro e que este iria ser melhor. Viste que não. Agora isso está te a fazer sofrer. A pessoa X é agora a pessoa Y. A pessoa Y já não é mais a pessoa X que amaste. É impossível transformá-la no que foi. Por mais que te custe a encarar, temos que saber lidar com todas estas mudanças. A Oliveira de hoje não é a mesma de quando tinhamos 15 anos. Esta foi apoderada por novas pessoas de 15 anos. O bolo de chocolate não sabe ao mesmo que sabia. Pensar dói. Recordar traz saudade. Querias tanto que fosse possível apagar determinadas memórias, ainda que estas fossem felizes, porque assim afastavas a melancolia presente. A saudade faz parte de nós, se faz.
Concordo que seja estranho lidar com tudo isto. Nunca pensei que fosse tão dificil. Não é a idade que te pesa. O que pesa realmente é saber que não podes voltar atrás. E se voltassemos atrás, achas que iriámos ser mais felizes? A dúvida reina em nós. O pior de tudo é que todas as tuas certezas transformaram-se em incertezas.
Não vale a pena programar a nossa vida, ela encarregar-se-á de te virar tudo. Deixa-te levar. Deixa-te ir na maré. Se realmente existe destino, ele já está traçado. Aprende a relativizar os teus problemas. Assim, serás mais feliz e lembra-te que para conseguires amar os outros, tens que primeiro amar-te a ti.

Nunca te sentiste tão longe das tuas origens como hoje e isso faz-te sentir mal. Nunca quiseste ser uma pessoa do mundo. Sempre primaste por manter o teu ninho. Dás por ti a pensar que estarias melhor num sítio que jamais pensarias gostar. Tão estranho. A vida faz-nos destas coisas.
Só deviamos pensar quando realmente quisessemos. Por que raio é que a cabeça pensa sem termos dado ordens? Por que raio as ideias surgem sem permissão? Recuso-me a pensar e dou por mim a fazê-lo SEM QUERER. Não quero. Não preciso. Faz-me mal. Que se lixe: quero que a ataraxia e o epicurismo reinem em mim. Só assim irei atingir o culme da felicidade. Gostava de ter memória de peixe. Recordar arruina-me. Não sei quem sou e só de pensar que já tive tantas certezas em mim, deixa-me exaurida. Isto é meramente um momento que amanhã vai parecer ridículo, mas hoje faz pleno sentido. Não se diz que escrever diminui a sede de sentir? Estou a sentir-me mais leve e mais bem resolvida, apesar de se adivinhar uma grande insónia. Parvoíce minha. Estupidez de quem gosta de se martirizar com algo que ninguém dá bola. Este crescimento, todas estas transformações deixam-me assim.
O que mais me irrita é saber que são poucas as coisas que posso controlar. É horrível ter consciência da impotência que temos sobre a vida. Não me importava de carregar o mundo às costas, mas ter poder sobre tudo o que realmente me interessa. Era tudo muito mais fácil, pelo menos para mim. A incerteza do futuro tira-me o sono, tira-me o sossego espiritual. Alguém está a comandar o que me rodeia tal como fazemos com os "Sims", mas gostava de ser eu a comandante. É injusto. A nossa vida parece um jogo e não somos nós próprios quem a está a jogar. Por mais que achemos que temos controlo, chegamos à conclusão que é tudo treta.

Por isso, cada vez mais concordo com o CARPE DIEM. Resta-nos aproveitar o momento, saboreá-lo como se não houvesse amanhã.